Em 11 de março a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou o vírus novo Coronavirus/Sars-Cov-2 como uma pandemia. Como forma de enfrentamento ao Covid-19 (doença provocada pelo vírus), a organização passou a recomendar reforço na manutenção da higiene pessoal, redução da exposição, distanciamento social, realização de testes, isolamento de casos suspeitos, monitoramento de pessoas que estiveram em contato, adiamento de viagens, fechamento de escolas, restaurantes, shoppings centers, casas de espetáculos, shows, suspenção de competições esportivas, antecipação de campanha de vacinações contra a gripe, entre outras.
Nos últimos dias, percebe-se que os conteúdos mais publicados, pesquisados e lidos são os que dizem respeito aos números de mortes, de infectados, de curados. Os tratamentos, a vacina, os efeitos colaterais, a testagem em laboratório, em animais, em seres humanos. As expectativas para com os cenários de desenvolvimento do vírus em meio à população, os riscos e graus de contágios, a expansão, o ápice da curva, a cristalização, o declínio; o comportamento do vírus nos diferentes países, nas diferentes regiões e cidades. A imprecisão e a demora na apresentação do "paciente zero" de cada país, subtestagem e subnotificação; o manejo dos corpos mortos e a crescente prática de sepultamentos sem os devidos ritos fúnebres e o adeus dos familiares.
Prossegue-se com crises econômicas, as oscilações da bolsa de valores, a crise bancária e do comércio, as medidas de ajuda à bancos, à empresas e aos trabalhadores informais. Presencia-se mudanças no discurso de autoridades no sentido de garantir ainda maior isolamento, em especial, o caso dos Estados Unidos e da Inglaterra, em contrapartida o perigoso reposicionamento do Brasil. No que tange o cenário nacional, testemunha-se autoridades de instituições mundiais e profissionais da ciência e saúde desmentindo nossas autoridades políticas. Paralelamente se sobressai um amplo quadro de crise político-institucional, envolvendo o poder executivo federal e os poderes executivos estaduais e municipais; o poder executivo com o poder legislativo, o presidente e a câmara dos deputados; o poder executivo e o poder judiciário, representado pelo Supremo Tribunal Federal/STF e o Ministério Público/MP. Se não bastasse, a crise na cúpula do governo, do presidente com seus ministros, percebe-se uma aproximação cada vez maior com os militares, considerando que os militares da reserva já controlam neste momento as principais pastas do governo.
No ano de 1985 existiam 42 nações com regimes e/ou governos democráticos, em 2015, contabilizavam-se 103, números que revelam um significativo crescimento das nações democráticas, mas não se pode esquecer o fato de que se tratam de regimes autoritários que foram rapidamente transformados em regimes democráticos, sabe-se que as estruturas e os processos conservadores e autoritários não podem ser desfeitos simplesmente com a troca de regime/governo (LEVITSKY; ZIBLAT, 2018).
A persistência das antigas estruturas, bem como o protagonismo em meio aos governos das novas lideranças, instituições, elites e a sociedade civil não conseguiram impedir que nações como o Brasil, Itália, Hungria, EUA, Inglaterra conduzissem ao poder lideres com discursos de extrema direita, marcada pela xenofobia, pelo racismo, pela intolerância, lideranças autoritárias e desprovidas de uma agenda de políticas públicas consistente.
Ao longo da história das democracias, ainda na Grécia antiga, a participação e a representação das mulheres, bem como de minorias sociais pouco foram consideradas. Tendo em mente as mulheres que nos antecederam e as que compartilham conosco deste momento histórico, as promessas da democracia pouco se realizaram, pouco as contemplaram, antes se apresentaram e apresentam como mais uma esfera e espaço de sujeição e exclusão.
A virtualização ou a midiatização do civismo e da cidadania e até mesmo as performances como o "Dia do Basta", "Basta corrupção", "Vem pra rua", "Fora Dilma" entre outros se revelaram melhor como golpes brancos de inconsistentes pautas e de parcas de ações efetivas. Os golpes se amontoam, quando se tem a sensação de que já foi visto tudo, eis que nos chegam os disparos de fake news cujo conteúdo ridicularizam personalidades engajadas e comprometidas com a educação, a cultura, a política, a ciência, a saúde, enfim... (KORYBKO, 2018).
Desgastes, obstruções e parcialidades se amontoam e facilmente podem comprometer a existência de instituições/organizações e zerar as condições de governabilidade pelas vias democráticas. Ó infortúnio! Dos amontoados de pequenos golpes precipitam-se golpes maiores! Quanta tormenta. O que o porvir nos reserva?!
AUTORES
Graciela Márcia Fochi ¹
Sandro Luiz Bazzanella ²
¹ Graduada em História/UPF, mestre em Patrimônio Histórico e Cultural/UNIVILLE, doutoranda em História Global/UFSC. E-mail: [email protected]
² Graduado em filosofia (FFCLDB/RS), Mestre em Educação e Cultura (UDESC) e Doutor em Ciências Humanas (UFSC). E-mail: [email protected]
REFERENCIAS
KORYBKO, Andrew. Guerras hibridas: das revoluções coloridas aos golpes. São Paulo: Expressão popular, 2018.
LEVITSKY, Steven; ZIBLAT, Daniel. Como as democracias morrem. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2018.
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