Embate entre ecologistas e ruralistas no plenário coloca em debate a averbação da Lei da Reserva Legal

Gracieli Polak

CANOINHAS/MAJOR VIEIRA

 

Uma questão polêmica tem gerado discussão pública entre dois Ministérios em Brasília, e muita reclamação nas propriedades rurais do interior do País. O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o Ministério do Meio Ambiente (MMA) travam uma disputa para definir o percentual de área que as propriedades agrícolas devem preservar sob a forma de reserva legal e a maneira como ela será aplicada. Em um lado da discussão, a necessidade da preservação dos biomas, do outro, a expansão agropecuária. Na sexta-feira, 6, o MDA conseguiu uma vitória e diminui o percentual de conservação da Amazônia e do Cerrado. Na Mata Atlântica, onde a porcentagem de área preservada é de 20%, a discussão tem outro foco.

A necessidade da preservação da vegetação nativa em todo País é indiscutível, mas a maneira como ela é aplicada aos proprietários de terras é alvo de reclamações e protestos, principalmente em Estados com características peculiares, caso de Santa Catarina. A vocação da região Sul para as pequenas propriedades rurais, cada vez mais divididas com o passar das décadas, faz crescer o embate entre o que é certo e o que é errado ao aumentar o rigor e colocar sob Legislação mais rígida o proprietário rural.

O Código Florestal Brasileiro, alterado pela última vez em 1965, estabeleceu uma série de critérios para a proteção de matas nativas, como a reserva legal, que define um porcentual das propriedades que deve ser preservado. Além disso, o Código definiu também as Áreas de Preservação Permanente (APPs), como encostas e matas ciliares, que se já tiverem sido desmatadas, têm de passar por processo de recuperação. A solução para salvar o meio ambiente, aplicada em Santa Catarina, segundo agricultores consultados pelo CN, se transforma em um grande problema nas pequenas propriedades.

 

DIFICULDADES

Para o agricultor João Honorato Walter, é difícil separar uma parcela de área para constituir a reserva legal quando a propriedade, em si, já é muito pequena. No entanto, Walter admite que a preservação é fundamental para que não haja escassez de recursos naturais no futuro, situação que, de acordo com ele, hoje é resultado de ações ambientais criminosas praticadas por grandes proprietários, que desmataram grandes áreas de terra.

A obrigatoriedade da reserva de 20% em cada propriedade, que começou a vigorar em 22 de julho de 2008, trouxe para o campo a discussão em torno da área a ser preservada e os prazos para que a recuperação acontecesse, pressionada pelo pagamento de multas em razão do descumprimento da Lei, mas, em 12 de dezembro, um decreto presidencial adiou em um ano a entrada efetiva em vigor da Legislação, dando mais tempo para que a adaptação aconteça e que novas propostas sejam discutidas pelos parlamentares. Quando em vigor, a Lei punia severamente os proprietários que não tinham 20% da propriedade com vegetação nativa, independente das APPs. Em Santa Catarina, uma portaria da Fatma permite que as áreas de APPs componham a reserva legal nas pequenas propriedades rurais devidamente certificadas como tal, o que, até agora, tem facilitado a continuidade dos pequenos agricultores na terra e garantirá maior área agricultável caso alterações no projeto não sejam realizadas.

De acordo com Luiz Cláudio Fossati, da Fundação de Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma), a propriedade com até 30 hectares de área, responsável por 80% da renda bruta do agricultor é considerada familiar e pode se beneficiar da portaria, aliando APPs com reserva legal, mas, para isso, é necessária entrada de processo junto à Fundação. Ele explica que hoje a região ainda passa por um processo produtivista, mas aos poucos começa a ser formada uma consciência ambiental e subsequente respeito ao meio ambiente, mediado por ações de educação e fiscalização.

A aplicação da Lei Federal no Estado, que apresenta características de ocupação bastantes diferentes em relação às grandes cadeias produtivas do País, de acordo com Fossati, é muitas vezes inviável. A constituição agrícola da região do Planalto Norte, formada por propriedades minúsculas que enfrentam dificuldades para se enquadrar na Lei, possibilita uma discussão das formas de inclusão aliada a preservação dos recursos naturais. ?Preservar 20% das terras é muito importante. Se esses 20% devem ficar dentro da propriedade, isso é um ponto que pode ser discutido. O que não é discutível é a necessidade da preservação, que deve ser clara e cumprida pelo proprietário de terra. Nossa função hoje, como Fatma, é fazer cumprir o que determina a Lei, mas é claro que é importante o empenho para desenvolver uma legislação que seja viável para ambos os pontos de defesa?, afirma.

 

AMEAÇA À AGRICULTURA

A Frente Parlamentar da Agropecuária, que defende a causa agrícola em Brasília, é uma das grandes opositoras da averbação da Lei da reserva legal, em defesa das áreas agricultáveis do País. De acordo com o deputado federal catarinense Valdir Colatto (PMDB), integrante da FPA, a averbação da reserva legal em 20% da área de cada propriedade é uma medida bastante prejudicial para o Estado de Santa Catarina. Segundo Colatto, a Legislação Ambiental imposta em todo o País com base nos biomas existentes é uma medida que inviabiliza a expansão rural. ?Nosso Estado tem uma estrutura característica marcada pela pequena propriedade rural e a reserva legal é um erro de origem da Legislação. É um erro porque coloca como unidade territorial a propriedade, que se divide e se transforma em inúmeras propriedades menores, diminuindo a área de plantio para cada produtor, que submetido a essa Lei, tem uma queda considerável na quantidade de terras agricultáveis?, explica.

Colatto defende que o fato dessa característica não ter sido observada representa um problema preocupante para a agricultura do Estado, protegida até dezembro de 2009 pelo decreto 6514, que adia o prazo para averbação da Reserva legal. O parlamentar acredita que, diante dos esforços realizados pela FAP em Brasília, até que a data prevista para funcionamento efetivo da Lei, uma nova Legislação Ambiental será aprovada para o País, respeitando as peculiaridades de cada região geográfica.