No aniversário de 349 anos da cidade, cultura e história se unem para perpetuar tradição da renda

Neste 23 de março, Florianópolis comemora 349 anos. A capital catarinense é conhecida internacionalmente por suas belezas naturais e culturais. Enquanto as praias são marco da natureza da ilha e atraem milhares de turistas todos os anos, a renda de bilro é tradicional da formação cultural açoriana de Florianópolis, podendo ser encontrada por todos os cantos da capital.

A formação espacial da ilha desenvolveu-se, principalmente, com a vinda dos europeus ao continente americano, a partir do século 16. Nesse período, a ilha que viria a ser a capital catarinense, se transformou em território estratégico para os navios vindos de Portugal. Foi com a chegada dos açorianos no território catarinense que a cultura da renda de bilro se difundiu na cidade. Até hoje, a renda de bilro é considerada patrimônio imaterial de Florianópolis.

Utilizando o bilro de madeira aos pares, as rendeiras enrolam a linha e embaralham os instrumentos para cruzar os fios e confeccionar produtos como vestidos, camisas e enxovais. Quem passa pelo Mercado Público Municipal da cidade, se depara com almofadas coloridas servindo de apoio para o movimento ágil das mãos das rendeiras. Segundo a Prefeitura de Florianópolis, atualmente, aproximadamente 700 rendeiras estão em atividade na cidade. Entretanto, manter viva esta tradição centenária é um desafio.

No box de número 78 do Mercado Público, está localizado o Armazém das Rendas, espaço da Prefeitura que expõe o trabalho de, pelo menos, 60 rendeiras da ilha. O objetivo do local é fomentar a produção da tradicional renda de bilro.

Neste box, a agilidade das mãos de uma pessoa em especial, que tecem as rendas, chamam a atenção de turistas e moradores locais. Edivaldo Pedro de Oliveira tem 65 anos e se intitula "o primeiro rendeiro homem de Florianópolis". Pelo menos, o primeiro que foi noticiado. Seu Dinho, como é conhecido, conta que precisou vencer preconceitos dentro e fora de casa para fazer renda.

Natural do bairro Pântano do Sul, tradicional vila de pescadores de Florianópolis, seu Dinho aprendeu a técnica com uma prima, aos 15 anos, escondido do restante da família. "Homem não podia fazer renda, Deus me livre! Imagina, ainda filho de militar", lembra ele, referindo-se a resistência da família.

Sobre sua orientação sexual, Dinho nunca manteve segredo e afirma que sofreu muito preconceito. "Um homem pode ser rendeiro e não ser gay, e um gay, nem rendeiro às vezes é. Eu fui um privilegiado, gay e rendeiro", brinca com a situação.

Após a morte da prima que ensinou a ele a arte de 'rendar', Dinho continuou praticando com os bilros e a renda se tornou uma terapia, que o ajudou a superar momentos difíceis. Além de expor seu trabalho no Mercado Público, Dinho também comercializa, aos domingos, em um bar tradicional no Pântano do Sul. Atencioso, o rendeiro atende os clientes do Armazém das Rendas e mostra, orgulhoso, os trabalhos expostos.

Símbolo da cultura de Florianópolis, a história do "Rendeiro Revolucionário" foi contada no livro "Costura Viva: Histórias de quem faz a moda na Capital Catarinense", das graduandas em jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Fernanda Kleinebing e Maria Clara Flores de Faria. Além de Dinho, o livro traz seis perfis de moradores da cidade que mudaram sua vida por meio da moda.