Há 8 anos, policial militar dedica-se voluntariamente a garantir a segurança dos alunos da EEB Sagrado Coração de Jesus; tendo como arma a gentileza, conquistou crianças, pais e motoristas
Reportagem publicada originalmente na versão impressa do Correio do Norte, em 27 de abril de 2018
Canoinhas - Todos os dias o cabo Rosmário dos Santos Veiga veste a farda que o acompanha há mais de 30 anos e segue para o trabalho. Antes de assumir seu posto no 3º Batalhão da Polícia Militar de Canoinhas, no entanto, faz uma parada de cerca de 45 minutos no caminho. Em vez do trabalho ostensivo ou mesmo o burocrático que o incumbe a função atualmente, dedica-se nesse tempo à segurança de pequenos cidadãos. Na atividade extra, também está sujeito a riscos: pode ser rendido por um grupo de crianças ávidas por um afeto. Nessas situações, entrega-se à espontaneidade de uma geração que está aprendendo com ele a admirar a figura do policial militar.
Foi depois de voltar da Reserva Remunerada para atuar pelo Corpo Temporário de Inativos da Segurança Pública (CTISP) que o cabo Rosmário começou a fazer, voluntariamente, a segurança dos alunos da Escola de Educação Básica Sagrado Coração de Jesus, que fica no caminho entre sua casa e o quartel. "Todos os dias eu passava por aqui e percebia o crescente fluxo de veículos passando em alta velocidade pelo entorno da escola. Então pedi autorização ao comandante e comecei a cuidar do trânsito no local", conta o policial.
Desde 2009, Rosmário está presente em frente ao Sagrado no período em que os alunos chegam à escola, e orienta o trânsito para garantir a segurança dos pequenos. No começo, ele conta, foi necessário certo esforço para controlar o fluxo, fazendo mais uso do apito. "Mas hoje os motoristas já sabem, têm consciência e respeitam", revela.
Gentileza mútua
Mas o trabalho voluntário voltado à segurança acabou também ajudando a superar o certo distanciamento ainda presente entre a comunidade e a autoridade policial. "Eu pegava na mãozinha da criança e ela estava tremendo. Percebi que muitas delas tinham medo da figura do policial, e que eu precisava desmistificar essa imagem", explica. E foi só questão de tempo para os pequenos se acostumarem à presença e carisma do policial e a entender que podem contar com ele sem receio.
O desafio se reinicia todo ano, com a entrada de novas crianças nos anos iniciais do ensino fundamental, que chegam ressabiadas, mas logo já se identificam com o tio fardado que as ajuda a chegar em segurança na porta da escola. Fazem questão de abraçá-lo antes de entrar, e os motoristas, habituados à cena, respeitam educadamente. "É um aprendizado para todos nós".
A lição que veio da experiência se reflete na vida pessoal e profissional do policial. A rigidez atrelada ao ofício amolece com o abraço sincero de uma criança. Na verdade, Rosmário nunca fez a linha policial durão - seguindo a postura necessária à função, que, é claro, por vezes exige a conduta mais firme, procura adotar a gentileza como estratégia. Com a fala tranquila, segura e sorriso no rosto, desarma qualquer pé atrás e ajuda a aproximar a instituição da comunidade. "É um trabalho que faz um bem tão grande para mim. Deve fazer para eles também, né?".
A comunidade concorda. "É nosso anjo", disse uma mãe que chegava para deixar a filha na escola. Cabo Rosmário fica sem jeito, agradece, e com essas e outras manifestações de carinho ganha mais motivação para o trabalho diário.
Todos os dias, Cabo Rosmário garante a segurança dos alunos na chegada à escola (Foto:Thaís Guimarães/CN)
Reconhecimento
O trabalho voluntário do policial é reconhecido. Desde cartinhas das crianças que guarda com carinho até a mais recente homenagem: a Câmara de Vereadores de Canoinhas vai conceder ao cabo Rosmário a "Medalha do Contestado", como forma de reconhecimento pelos serviços prestados ao município. Durante discussão do requerimento assinado por toda a edilidade, no início do mês, os vereadores ressaltaram o valor do trabalho voluntário, que deveria ser considerado por mais pessoas.
A homenagem, que ainda não tem data para acontecer, tem uma motivação especial. Depois de oito anos no Corpo Temporário, tempo em que fez questão de se manter na função mesmo após a aposentadoria, cabo Rosmário está na reta final do prazo para sair da instituição.
O policial se emociona e as palavras lhe faltam ao ser perguntado sobre como encara a aposentadoria. Como se adaptará à nova rotina, não sabe dizer. Sabe que quer continuar realizando trabalho voluntário e espera que mais pessoas se sensibilizem para o voluntariado. Porque além do bem para o próximo, ele garante que há o retorno pessoal. "Há tanta gente precisando e a gente sempre pode se doar um pouco".
Deixe seu comentário