Paulo Bauer (PFL) foi o candidato mais votado em Canoinhas nas últimas eleições

JOINVILLE/CANOINHAS - Entre os dias 30 de maio e 1.º de junho deste ano, pelo menos seis joinvilenses conhecerão Brasília, totalmente de graça. A promoção não faz parte de nenhuma estratégia de marketing de loja de departamentos, empresa de turismo ou de aviação. A ?festa das passagens?, patrocinada com dinheiro público, foi promovida pelo deputado federal catarinense Paulo Bauer (PSDB) no dia 28 de abril num restaurante de comida italiana em Joinville, segundo denúncia do jornal A Gazeta de Joinville. O dinheiro que promove o turismo no Congresso Nacional sai da cota que o deputado tem direito para sua locomoção, hospedagem e alimentação. A prática não é privilégio só da oposição. Quem também admite a distribuição de passagens é o governista, relator do orçamento da união para 2006, deputado Carlito Merss (PT). Enquanto Bauer prefere sortear parte de sua cota de passagens para quem ele define como ?amigos da imprensa?, Merss fornece bilhetes aéreos sobressalentes para consultas médicas em Brasília ou para estudantes participarem de congressos, como ele mesmo admite. O petista diz receber mais de 100 pedidos por mês, mas não pode atender a todos. ?Se tiver algum furo a fiscalização derruba. A opção dele (Bauer) é dar para jornalistas. Eu nesses oito anos já doei passagens para quem precisou participar de congressos ou ir ao hospital Sarah Kubitschek em Brasília. Mas que é dinheiro público isso é?, confirma o petista. Questionados sobre a legalidade do ato, ambos tratam com naturalidade. ?A princípio não teria nada ilegal?, resume Merss. O tucano Paulo Bauer vai mais longe e inclusive explica como funciona o esquema das viagens. Segundo ele, a Câmara dos Deputados oferece para cada parlamentar crédito de quatro passagens por mês, no trecho Brasília ao Estado de origem e Estado de origem a Brasília. O valor que a Câmara paga é pelo teto máximo que as companhias aéreas cobram. ?Se você chegar no balcão daqui a um minuto comprar uma passagem para embarcar em meia hora o valor sempre será o valor pelo máximo?, exemplifica.

 

?AMIGOS DA IMPRENSA?

 

Há três anos Bauer oferece uma refinada festa para a imprensa, na qual sorteia as passagens, esperada com ansiedade por alguns. Neste ano, o evento aconteceu no restaurante Piazza Itália, um dos mais requintados da cidade. A confraternização não foi para divulgar nenhum projeto, ou ação do deputado, mas simplesmente para ?homenagear os amigos da imprensa? como descrito no convite, que leva o timbre da Câmara dos Deputados. Já na entrada da festa a assessoria do deputado assinalava na lista de convidados os que iriam concorrer às passagens, hospedagem, alimentação e translado em Brasília. Entre os presentes, diversos radialistas e jornalistas conhecidos em Joinville. Ao todo, foram 100 participantes, dos 150 esperados. Bauer também faz sorteios de passagens em evento semelhante no vizinho município de Jaraguá do Sul, também seu reduto eleitoral. Antes de iniciar o sorteio, o deputado ironicamente pediu voto para sua reeleição. ?Agora um detalhe heim? Como a viagem é em maio, quem for tem de levar junto o título de eleitor, dar o número do título e a zona?, disse ele, que diante dos risos dos convidados, arrematou: ?Não vem querer fazer essa sacanagem comigo. Viajar e não votar no Paulo Bauer, aí não dá meu!?. Durante a entrevista, Bauer coloca ainda mais polêmica no ventilador. ?Dizem que tem deputado que usa para passear no exterior, já eu prefiro distribuir para amigos?, declarou diante do gravador.

 

VIAGENS PARA ESTUDANTES, JORNALISTAS E ASSESSORES

Pelo que diz Bauer, cada um dos 513 deputados pode reservar suas passagens. A ação faz com que os parlamentares poupem créditos ou consigam passagens mais baratas para posteriormente serem revertidas em novas aquisições. ?A Câmara não dá o dinheiro, dá crédito da passagem. A Câmara me dá um crédito de, por exemplo, R$ 1 mil para cada passagem. Mas se eu reservar sai por R$ 500, obviamente, sobram outros R$ 500. Essa sobra não pode ser vendida. Nesse mandato já devo ter ofertado 50 passagens aéreas?, revela. Porém, os gastos dos deputados catarinenses apresentam diferenças gritantes. Merss, por exemplo, permanece dentro da média de gastos do peemedebista Adelor Vieira, cujas cifras giram em torno de R$ 13 mil por ano, diferente de Bauer que gasta 300% a mais no mesmo item referente à locomoção, hospedagem e alimentação. O que poderia representar uma economia ao orçamento do Legislativo, gera ao deputado a possibilidade de patrocinar as viagens de turismo à Capital Federal. ?Eu poderia devolver o valor que economizo para o Estado ou poderia permitir que jornalistas, formadores de opinião, vereadores, dirigentes de entidade de classe possam ir a Brasília. Eu prefiro a segunda opção. Porque devolver para o governo significaria permitir que o Lula pagasse mais uma prestação do avião que ele comprou pra viajar pelo Brasil.?, admite o deputado.

 

PASSAGENS SÃO PARA USO EXCLUSIVO DOS PARLAMENTARES

Somente no ano passado, segundo informa o site da Câmara dos Deputados, Paulo Bauer gastou R$ 62.038,35 na cota prevista para locomoção, hospedagem e alimentação. Carlito Merss utilizou no mesmo período R$ 13.791,83 e Adelor Vieira R$ 12.415,07. Segundo Hudson Luiz Correia de Lima, diretor da Coordenação de Gestão de Cota Parlamentar da Câmara dos Deputados, as passagens são de uso exclusivo dos parlamentares. ?A legislação interna da Câmara é clara de que a cota mensal é ?do deputado?, portanto, uma concessão individual ao parlamentar no exercício do mandato?.

Nada na legislação autoriza a emissão de passagens para outros, inclusive para a assessoria do próprio parlamentar. Ocorre que, a partir da leitura generalizada de que a cota é individual, do parlamentar, o mesmo estaria autorizado a utilizá-la da forma como lhe convém. Isso poderia representar uma transgressão da norma interna?.

Por telefone, Lima informou ainda que não existe legislação autorizando a distribuição aleatória de passagens. ?O ato da mesa diretora da Câmara nº 42 / 2000 que regulariza a cota de passagens não permite a distribuição das mesmas?, orientou.

 

PARA FENAJ, SORTEIO É  ?JABÁ DA PIOR ESPÉCIE?

A prática é condenada pelo presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), Sérgio Murillo de Andrade. ?É jabá da pior espécie. É crime de corrupção ativa e também passiva, para quem se beneficia dessas benesses. Está mais do que na hora dos políticos pararem com esses tipos de ?regalos? para a imprensa. E já passou da hora dos jornalistas pararem de aceitar. Para uma profissão que está em busca de uma valorização, esta prática condenável, é um grande retrocesso? diz indignado. Não é bem assim que enxergam outros comunicadores. Na ocasião, um dos radialistas ficou incomodado com o fato de os sorteios serem motivo de reportagem. Inclusive, dois deles saíram em defesa desse tipo de evento. ?Você não consegue nem se manter como jornalista, tem que fazer serviços à parte, e agora vem aqui, come, bebe e quer detonar com o deputado?, condenou Osmann Lincoln. Já Acácio Martins, ou Cacá Martan, vê nesse tipo de ocasião uma oportunidade para se relacionar e estar mais perto dos políticos. ?Se o Carlito ou o Adelor Vieira oferecerem um jantar desses, eu também vou, pois se trata de uma forma de aproximação, de sabermos o que estão fazendo?, argumentou Martan, referindo-se não às passagens, mas ao jantar em si.

A festa deste ano foi regada a uísque importado e comida italiana. No cardápio, entrecote, risoto de aspargos, escalope de batatas, penne a mediterrânea, molho de figo com aceto balsâmico, maçã ao vinho e frutas da estação laminadas. A bebida também foi refinada. Bauer ofereceu ao seleto grupo de convidados três garrafas de uísque Red Label, 13 de vinho Santa Helena, 112 de cerveja, 103 refrigerantes entre outros quitutes.

Bauer foi o candidato a deputado federal mais votado em Canoinhas nas últimas eleições. Entre os jornalistas beneficiados com as passagens a Brasília, está Ricardo Portelinha, que atuou em Canoinhas como editor dos jornais Correio do Norte e, por último, como repórter do jornal Diário do Planalto.

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Com informações dos jornais A Gazeta de Joinville e Absoluto