Nas comemorações pelos 100 anos da chegada dos japoneses no Brasil, o CN homenageia os japoneses que vivem na região com o exemplo de dona Kimiko Kuroiwa

Sabedoria, tranqüilidade e paciência são palavras normalmente associadas ao povo de origem japonesa. Essas características se aplicam facilmente à senhora de sorriso cativante e olhinhos puxados que, apesar de morar no Brasil há quase 50 anos, não se sente completamente familiarizada com a língua portuguesa. Kimiko Kuroiwa, japonesa de nascimento e brasileira de coração, com seu sotaque carregado, diz que não fala nem entende português muito bem, mas sorri calorosamente cada vez que seu nome é pronunciado de maneira equivocada, enquanto comercializa as verduras e hortaliças que produz de forma orgânica, sem usar agrotóxicos em sua casa, em Canoinhas.

Marcados pelo bom senso na culinária, pela eficiência na produção agrícola e pela filosofia de uma vida equilibrada, a presença do povo japonês no País completou recentemente 100 anos, comemorados por toda a comunidade nipônica, inclusive com a presença do príncipe Nahurito em eventos realizados no Brasil. Com o país sofrendo atrasos econômicos e com a pobreza aumentando, no começo do século 20, a solução para milhares de japoneses foi tentar a vida em terras distantes, como as brasileiras, desconhecidas tanto na língua como na cultura.

 

UMA MULHER DE CORAGEM

 

Kimiko Kuroiwa foi à exceção da regra. Não veio para o Brasil com os pais. Deixou-os no Japão e veio atrás do noivo, que anos antes, trocou a pobreza em que viviam no norte do Japão por um emprego na promissora São Paulo. Juntamente com a irmã mais velha, ela apenas com 24 anos, desembarcou no Porto de Santos sem saber uma única palavra de português, depois de uma viagem de navio que durou 45 dias.

Morou em São Paulo, depois Curitibanos, Monte Castelo e há cerca de 20 anos, Canoinhas. Aqui ela cultiva hortaliças, como couve-flor, repolho e brócolis, além de batata, feijão, beterraba, entre outras. Na já tradicional feira, que acontece nas quartas-feiras e no sábado, sempre ao lado da igreja Matriz, dona Kimiko comercializa seus produtos e atende a todos os seus clientes com simpatia e agilidade. Além das verduras, ela também vende tofu, o queijo de soja, típico da culinária japonesa. Em casa, ela diz que ainda faz muito sushi, sashimi e yakissoba, mas apenas para a família, que ainda preserva muitas das tradições da terra natal. E a língua é o principal elo nesse cultivo de tradições, palavra que dona Kimiko não conseguir entender direito.

Na casa da família ainda se fala japonês, mas um pouco de português também. ?Toda semana eu recebo jornal japonês, que vem de São Paulo?, conta. O jornal que ela e o marido, Kaneharu, recebem semanalmente, escrito na língua mãe, os aproxima do Japão que foi deixado para trás, mas que hoje representa apenas uma vaga lembrança de juventude.

A japonesa explica que veio para cá para tentar melhorar de vida, porque a pobreza em seu país estava cada vez maior. No Brasil casou-se, teve cinco filhos, construiu uma vida feliz que não troca pela que teve no Japão. Voltar para lá, definitivamente, não está nos planos da sorridente vendedora de verduras. ?Não, eu nunca mais quis voltar para o Japão, morar lá de novo. É bom ir para visitar, ver os parentes, mas voltar, não tenho vontade. Lá faz muito calor, depois muito frio, sem contar os terremotos?, afirma, em seu português arrastado.