
Líder anti-imperialista em Burkina Faso, Traoré se destaca na África

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Líder anti-imperialista em Burkina Faso, Traoré se destaca na África (Fotos: Agência Brasil)
Com forte discurso anti-imperialista, nacionalista e pan-africanista, o presidente interino de Burkina Faso, Ibrahim Traoré, tem reivindicado a herança política de históricos líderes anticoloniais da África, como Thomas Sankara, da própria Burkina, e Patrice Lumumba, do Congo.
“Gostaria de expressar minha gratidão a todos os patriotas amantes da paz e da liberdade e pan-africanistas que se reuniram ao redor do mundo para apoiar nosso compromisso e nossa visão de um novo Burkina Faso e uma nova África, livre do imperialismo e do neocolonialismo”, afirmou Ibrahim Traoré após seu governo desmantelar outra tentativa de golpe de Estado, em abril deste ano.
Traoré assumiu como chefe de Estado após um golpe militar, em setembro de 2022, na esteira da onda de levantes militares do Sahel africano que tomou os governos no Mali, em 2020, e no Níger, em 2023.
O jovem militar tem se destacado como símbolo dessa transformação no Sahel da África Ocidental, chamando a atenção do continente e do mundo, assim como atraindo a hostilidade de potências ocidentais, em especial dos Estados Unidos e da França.
O imperialismo é o conceito usado quando “um país central se vale de seu maior poderio econômico, político e militar para subordinar países periféricos de acordo com seus próprios interesses”, explicou o sociólogo Raphael Seabra, professor da Universidade de Brasília (UnB).
A expulsão das tropas francesas de Burkina Faso, a nacionalização de minas, a criação de bancos públicos, acordos com Rússia e China, medidas para se desvincular da moeda francesa, o franco CFA, projetos de industrialização e a proibição de exportação de alimentos foram algumas das ações tomadas pelo novo governo.
O país tem uma população de cerca de 23 milhões de habitantes, um pouco acima de Minas Gerais (MG), em um território com área semelhante à do Rio Grande do Sul (RS). A nação vive há cerca de 15 anos uma guerra civil contra grupos terroristas islâmicos, que vitimou dezenas de milhares de pessoas.
Ibrahim Traoré estudou geologia na Universidade de Uagadugu, nome da capital do país. Entrou no exército e lutou contra esses grupos insurgentes no norte de Burkina.
Che Guevara africano
Segundo o jurista e analista geopolítico Hugo Albuquerque, além de contar com forte apoio popular dentro de Burkina, Traoré tem ampliado sua influência política para toda a região.
“Como Che Guevara era um símbolo para a América Latina inteira, ele é um símbolo para aquela região. Ele se assenta em uma legitimidade popular grande dentro do país porque tem feito reformas e distribuído a renda da exploração mineral. Os militares reconhecem nele uma liderança importante”, avalia.
O pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Sobre África, Ásia e Relações Sul-Sul (NIEAAS), o historiador Eden Pereira Lopes da Silva, avalia que Ibrahim resgata, não apenas em termos teóricos, mas também práticos, figuras históricas que promoveram o pan-africanismo, corrente política que prega a união da África contra o assédio estrangeiro.
“Eram figuras que tinham uma visão mais revolucionária e anti sistêmica para os seus países, mas também para o continente africano como um todo. Eles defendiam uma posição contrária ao sistema colonial e capitalista que explora os países africanos durante décadas e séculos”, diz o pesquisador.
Para Silva, Ibrahim Traoré percebeu que o mundo está em transformação e concluiu que Burkina Faso não deveria manter a relação comercial subordinada aos interesses franceses.
“Ele se afirma como um governo de caráter nacionalista e se identifica em solidariedade com vários países que lutam pela sua soberania. E a população de Burkina Faso expõe isso em suas manifestações constantemente”, acrescentou.
Para o especialista Hugo Albuquerque, Traoré herdou a cultura política socialista iniciada por Thomas Sankara, líder da fundação de Burkina Faso.
“Intelectuais que sobreviveram, mesmo depois da derrubada de Sankara, continuaram militando e se articulando, inclusive com participação nas Forças Armadas, que é a grande instituição nacional no fim das contas”, destacou.
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