Estudo prevê substituição de roedor em testes antiveneno de serpentes
Pesquisa da bióloga Renata Norbert, do Instituto Nacional de Controle da Qualidade em Saúde, da Fundação Oswaldo Cruz (INCQS/Fiocruz), sobre a substituição de camundongos por ensaios in vitro para controle da qualidade de soros contra o veneno de cobras do gênero Bothrops, foi premiado pela Sociedade Europeia para Alternativa de Testes em Animais, no 13º Congresso Mundial de Alternativas ao Uso de Animais.
O trabalho obteve também menção honrosa do Centro Nacional para a Substituição, Refinamento e Redução de Animais em Pesquisa, organização científica britânica.
Bothrops é um gênero de serpentes da família Viperidae, popularmente denominadas de jararacas, cotiaras e urutus. A picada dessa serpente é a causadora do maior número de acidentes com cobras no Brasil. Somente este ano, o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS) registrou 12 mil acidentes desse tipo.
Em entrevista para a Agência Brasil, Renata Norbert disse que o estudo vem sendo desenvolvido há algum tempo porque, desde 2001, o INCQS vem fazendo apelos para a substituição desses animais, não só para evitar o sofrimento da espécie nos testes, mas também porque a pesquisa demonstrou resultados mais rápidos e mais baratos.
Segundo Renata, a cadeia produtiva antiveneno engloba muitas etapas. Em todas elas, desde a produção, há um controle interno para assegurar a qualidade.
Ao final da produção, o lote vai para teste no INCQS, onde também é utilizada uma grande quantidade de camundongos visando a liberação do produto para o Programa Nacional de Imunização (PNI) para a população brasileira.
Nós conseguimos avançar na fase de pré-validação que, até o momento, no mundo inteiro, não existe para antivenenos. Existe para cosméticos, existe para outros produtos. Para antivenenos, é a primeira pesquisa que chega à fase de pré-validação, acentuou Renata.
Agora, o estudo está na última fase, que abrange a reprodutibilidade de outros laboratórios para atestar a robustez do método. Os outros laboratórios vão testar a metodologia que a gente pré-validou para observar se eles conseguem obter os mesmos resultados. Acho que esse foi o maior diferencial do nosso trabalho: avançar um passo a mais na validação.
Metodologia
A substituição de camundongos por células Vero, cultivadas em laboratório, poderá ser adotada também por produtores, o que evitará o uso de roedores. A metodologia in vitro prevê o uso dessas células Vero que, após serem fixadas em placas, recebem uma mistura de soro com veneno.
Caso as células permaneçam intactas, o soro está aprovado porque inibiu a ação do veneno. Qualquer efeito tóxico, ao contrário, significa que o soro foi reprovado.
Depois dessa etapa, a meta é submeter o resultado da pesquisa para a farmacopeia brasileira, de modo a colocá-lo em prática. A gente quer sair da pesquisa e aplicá-la na prática, diz a especialista.
Serão montados kits de ensaios para que os laboratórios possam realizar a metodologia e verificar os resultados, fazendo-se ainda a comparação entre os resultados apresentados pelos laboratórios. Com os dados, a gente faz a estatística e vê a reprodutibilidade, se eles conseguem obter os mesmos resultados que a gente conseguiu no INCQS, frisa Renata. Esses resultados serão publicados e submetidos aos órgãos reguladores. O nosso sonho é fazer um estudo maior, que incluísse até laboratórios fora do Brasil porque essas serpentes Bothrops existem em outros países, como a Costa Rica, por exemplo. Não se limitam ao Brasil, acrescenta.
Para Renata Norbert, o reconhecimento internacional obtido pelo estudo foi um estímulo a mais para dar prosseguimento à pesquisa. Ela acredita que - partir de março de 2026 - o projeto poderá ser colocado em prática.
Ganhos
Em dezembro deste ano, Renata irá se reunir com os produtores e um número maior de pessoas interessadas na multiplicação desse conhecimento visando colocá-lo em prática. Ela quer tentar a expansão do projeto para o exterior. A premiação contribuiu para isso. A bióloga do INCQS reforçou que o método é mais rápido e barato do que utilizando os camundongos. Chega a reduzir em até 69% o custo, frisou.