Em entrevista à Agência Brasil, Gisele Nery, mãe de uma das estudantes da Emei Antônio Bento, acompanhou todo o desdobramento do caso.
Integrante do conselho da escola e representante das famílias da sala, ela confirmou que, na véspera da chegada dos policiais, o homem rasgou o desenho de Iansã feito pela filha em uma atividade com a turma. "Só que antes ele tirou a filha dele de perto, para ela não ver", acrescentou.
A conselheira disse que o gesto agressivo gerou desconforto e surpresa para as outras crianças, como sua filha. "Ela chegou em casa e perguntou: não entendi, mamãe, por que ele rasgou e ainda gritou com a nossa professora?"
Segundo Gisele Nery, os pais e os profissionais da instituição de ensino tentaram estabelecer um diálogo com o pai e o convidaram a participar da atividade, para compreender mais sobre a temática, mas ele ignorou as mensagens encaminhadas.
A conselheira relatou ainda que os policiais ameaçaram dar voz de prisão à diretora, que é negra. Naquele instante, os conselheiros, que estavam em uma reunião, escutaram a discussão e saíram em defesa da diretora.
"A polícia foi dar voz de prisão a ela. Mas aí todo mundo já tinha visto a cena, as crianças viram."
A universitária Milena Leite, do curso de Pedagogia, classifica o acontecimento como uma investida "brutal" e inaceitável. "Não só dentro da educação escolar. Isso está bem presente fora da escola, mas adentra a escola", diz.
"Eles chegam com muita brutalidade quando se fala de deuses africanos. Se fossem deuses nórdicos, gregos, Jesus Cristo, não teria tanto esse problema."
De acordo com o Ministério da Igualdade Racial, a atividade de apresentação de orixás está em consonância com as leis nº 10.639, de 2003, e n º11.645, de 2008, que determinam o ensino da história e cultura africana, afrobrasileira e indígena nas escolas.
Entenda o caso
Quatro policiais militares entraram, portando armas, na Emei Antônio Bento (Butantã), depois de terem recebido a ligação do pai. O caso ocorreu na tarde da última quarta-feira (12). O pai teria dito que a filha estaria sendo obrigada a ter aula de religião africana.
No dia anterior, terça-feira (11), o pai da criança já havia ido à escola demonstrar sua insatisfação em relação à aula e teria retirado do mural o desenho de Iansã que a filha havia feito.
Os policiais permaneceram na escola por mais de uma hora e foram embora por volta das 17h10 junto com o pai da aluna.
Em nota, a diretora Aline Aparecida Nogueira informou que a escola não trabalha com doutrina religiosa" e que o "trabalho centrado a partir do currículo antirracista. Ela disse ainda ter sido coagida e interpelada pela equipe por aproximadamente 20 minutos.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que a Polícia Militar instaurou apuração sobre a conduta da equipe que atendeu à ocorrência, inclusive com a análise das imagens das câmeras corporais. Segundo o órgão, a professora da unidade de ensino registrou boletim de ocorrência contra o pai da estudante por ameaça.
A Secretaria Municipal de Educação também se manifestou sobre o caso e escreveu que o pai recebeu esclarecimento que o trabalho apresentado por sua filha integra uma produção coletiva do grupo e que a atividade faz parte de propostas pedagógicas da escola, que tornam obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena dentro do Currículo da Cidade de São Paulo.
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