Tendo como pano de o fundo a apreensão com o quadro fiscal e o cenário político doméstico, a aversão maior ao risco vinda do exterior após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, informar que prepara um aumento expressivo de tarifas para produtos da China impulsionou a alta dos juros futuros negociados na B3 na segunda etapa do pregão desta sexta-feira.

Segundo participantes do mercado, em um dia carregado de eventos que trouxeram maior volatilidade aos ativos locais, é difícil apontar um único gatilho que tenha provocado a disparada dos juros intermediários e longos. Mas o anúncio de Trump, feito por volta das 12h, coincidiu com a maior abertura da curva local e também com a disparada do dólar.

Os DIs chegaram a iniciar a sessão em viés de queda, ainda na esteira do movimento de ontem que refletiu a surpresa baixista com a inflação de setembro e a derrota da Medida Provisória (MP) 1.303, mas a continuidade da melhora não perdurou. Somente a ponta mais curta da curva, mais correlacionada à trajetória da Selic no médio prazo, operou em leve recuo ao longo da tarde.

Encerrados os negócios, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027 oscilou de 14,024% no ajuste de quinta-feira a 14%. O DI para janeiro de 2028 avançou de 13,397% no ajuste a 13,430%. O DI para janeiro de 2029 marcou 13,410%, vindo de 13,341%. O DI para o primeiro mês de 2031 subiu de 13,587% no ajuste para 13,675%.

Analista de renda fixa da Empiricus Research, Laís Costa afirma que a deterioração acentuada dos DIs no fim da primeira etapa do pregão de hoje pode estar relacionada a ajustes técnicos, uma vez que não houve um condutor específico muito claro para a ascensão. Considerando o fluxo de notícias do dia, no entanto, a subida de tom de Trump em relação à China num momento em que a escalada das tensões comerciais já parecia ter ficado para trás pode ter sido o motor para a alta.

"A escalada das tarifas já tinha acabado e esse risco já havia sido retirado das curvas. Quando essa discussão se reacende, há um fluxo de saída de recursos dos emergentes, o que afeta diretamente o Brasil. Quem vende China, vende Brasil junto. Toda vez que acontece algo com a economia chinesa, afeta diretamente nossa moeda", diz Costa, o que também acaba se refletindo no mercado de renda fixa.

"Prêmios de risco voltam a ser colocados na curva porque se os EUA vão rediscutir o acordo com a China, podem rediscutir com todo mundo. Essa questão da China é importante e por si só já explicaria o movimento na curva de juros e no dólar", afirma a analista, ponderando que a reação pode ter sido exagerada. "Pode ser que tenha algum ajuste técnico", acrescenta Costa, que aponta a questão fiscal como outro vetor de alta para as taxas hoje, ainda que não o principal driver em sua visão.

Os agentes também monitoraram notícia veiculada mais cedo pelo Estadão/Broadcast sobre um "pacote de bondades" em elaboração pelo Executivo, que poderia ter impacto de R$ 100 bilhões no orçamento de 2026. Também nesta sexta, o Planalto anunciou nova política de financiamento habitacional que libera R$ 36,9 bilhões em recursos de forma imediata.

Para Ricardo Trevisan Gallo, CEO da Gravus Capital, a trajetória observada na sessão de hoje nos DIs representa uma correção do que, em sua percepção, foi um excesso de otimismo nesta quinta. "A combinação de inflação acima do teto da meta, dólar em disparada e incertezas fiscais crescentes cria um ambiente em que os juros futuros naturalmente se ajustam para cima, especialmente nos vencimentos longos."